21 outubro 2006

Vida e morte

Maputo, Avª Friedrich Engels, Jardim dos Namorados, hoje, sábado, 10 horas. Os carros começam a chegar. À frente o mercedes, engalanado com fitas e folhos. Depois toyottas. A seguir um autocarro do ministério. Fecha a caravana um séquito de chapas apinhados. O agregado parental e de amigos escalonados por diferenças sociais visíveis. À frente, os vestidos feitos pelas costureiras de ponta, à retaguarda os vestidos e as blusas xicalamidade. Buzinas, paragem, saída. O coral, a festividade corporal, sai a noiva primeiro, sai o noivo depois, ambos com ar sério, solene, de boletim da república. Ida ao jardim, a filmagem, o ritual da homenagem, a saída. A noiva está grávida talvez de sete meses.
No mesmo momento, cemitério de Lhanguene, centenas de pessoas visitam os seus mortos, recontactam os espíritos. Os cortejos, as flores, as vestes pesadas, aqui e acolá o choro. Os adolescentes que oferecem água para as flores e que cuidam das campas. Crianças brincam ao pé coxinho. No exterior, as vendeiras de flores, os guardadores de carros, o tráfego buliçoso dos chapas, a estrada internacional privatizada pelos visitantes.
Releio Heráclito, cumprimento os contrários. "O mesmo está em nós, vida e morte".

1 comentário:

Carlos Serra disse...

Ainda hoje me interrogo sobre o sentido da dialéctica de Heráclito, a qual é, afinal, a nossa, mas que esquecemos no barco da lógica formal. Fascina-me fascinar-me com esta vida fascinante, dor e alegria mãos dadas. Abraço.