29 novembro 2006

Isenção/neutralidade


Existem palavras muito sérias, muito dignas, sem rugas, de um verniz de respeitabilidade impoluta. Essas palavras são isenção e neutralidade. O seu sumo é o mesmo.
Quando uma pessoa não toma posição perante um determinado fenómeno, dizemos que ela é neutra, que ela é isenta. Por outras palavras, que ela não se apaixona, não toma partido, não se inclina para um lado, que tem os nervos grilhetados pelo bom senso. Digamos que é uma espécie de ministro dos negócios estrangeiros da República do Equilíbrio Equilibrado.
Tudo é ainda mais fascinante quando estudamos a técnica de escrita dos cientistas sociais. A técnica mais corrente e institucionalmente apreciada é a aquela que consiste em descrever fenómenos e narradores de fenómenos como se descrevêssemos átomos ou máquinas. Eles dizem isto e aquilo, eu mostro-vos o que eles dizem, eu revelo-vos como as coisas não são o que parecem ser, a vida não é unívoca, confiem na minha neutralidade, etc. O mar pode existir amputado das convulsões.
Aliás, basta estudar os laboratórios dos directores de teses científicas e verificar o enorme esforço que muitos deles fazem para extrair o sexo aos fenómenos.
Resta acrescentar que o calmo Newton dos fenómenos sociais é especialmente apreciado quando conforta os príncipes pela sua neutralidade, pela sua alma de anjo. Perante duas soluções, ele dirá, com ar de calmo questionador socrateano ao volante de um 4/4, que pode haver uma terceira que retira das duas anteriores os frutos mais adequados, mais sensatos, obviamente neutros.
O que importa é navegar nas águas sem que os remoinhos nos incomodem. Nada de excessos, nada de úlceras desnecessárias. A este propósito, já propus, em entrada anterior, uma palavra impertinente para definir os Newtons sociais da terceira via: óciólogos.

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