O blogue "Diário de um sociólogo" foi seleccionado em 2007 e 2008 pelo júri do The Bobs da Deutsche Welle - concurso internacional de weblogs, podcasts e videoblogs - como um dos dez melhores weblogs em português entre 559 concorrentes (2007) e um dos onze melhores entre 400 concorrentes (2008). Entrevista sobre o concurso de 2008 no UOL, AQUI.
30 junho 2009
Novidades no bricolando

E a Noventa?

Adenda: obrigado ao Ricardo, meu correspondente em Paris, pelo envio da referência sobre a empresa.
Guiné-Bissau

Valor no mercado de portais de Moçambique

29 junho 2009
Por que acreditamos que...? (2)

Porém, todas as perguntas remetem para um solo comum, para um mesmo fio condutor.
Ora, sempre me interrogo sobre a função primeira do pensamento. Encontrei a resposta, eventualmente banal, nos pragmatistas americanos. Produzir a crença é a única função do pensamento – escreveu um dia Charles Pierce. O progresso científico é a integração permanente de informação numa rede coerente de convições - defende Richard Rorty.
Nesse sentido, as diferenças entre perguntas e respostas, entre contextos e épocas, esbatem-se. Somos todos, afinal, crentes.
(fim)
Recursos de poder e estigmatização

28 junho 2009
Quatro elefantes nas margens do Zambeze

Introdução de um texto do Eng.º José Lopes: "Quando nos próximos tempos se ponderar a emissão de licenças ambientais de quatro novas mega-centrais eléctricas nas cercanias de Tete/Zambeze [2 hidroeléctricas (Cahora Bassa/Norte e Mphanda Nkuwa) mais 2 térmicas a carvão (Moatize/Vale e Benga/Riversdale)], seria desejável que, ao invés de uma mera avaliação individual dos projectos, as autoridades moçambicanas nos oferecessem uma detalhada análise comparativa entre estes quatro projectos."
Casamentos ontem: rituais de azáfama
Aos sábados, na cidade de Maputo, a Avenida Friedrich Engels e o Jardim dos Namorados ficam repletos de gente alegre e ansiosa que ali cumpre uma parte significativa do ritual dos casamentos, ritual regra geral iniciado no Palácio dos Casamentos, na Avenida Julius Nyerere. Ontem era literalmente impossível transitar naquela avenida. Dezenas de nubentes, centenas de pessoas de todas as idades e grupos sociais, corais e cânticos de pendor vincadamente relogioso, carros último modelo e chapas, vendedores, uma azáfama multiforme ajustando as regras do informal desde as 9 até, sensivelmente, 18 horas. Para vós, dois pequenos momentos que captei à entrada do Jardim dos Namorados e na Engels:
27 junho 2009
Os linchadores de Nooji

Não há muito tempo ainda, o treinador holandês da nossa selecção nacional de futebol sénior, Mart Nooij, era um homem venerado. Se não ganhavam, os nossos mambas pelo menos empatavam. Os sonhos de chegarmos ao mundial e ao CAN estavam firmes. A seleção começou a perder, jogando com equipas bem mais ganhadoras do que a nossa e logo Nooji tornou-se suspeito, mefistófeles a punir. Perdemos no Quénia por 1/2. De quem foi a culpa? Obviamente que de Nooiji - , argumentam os justiceiros do futebol à procura de um bode expiatório. Aqui como em tantos outros campos da vida, os mais sensatos de nós à superfície parecem ter a mesma alma daqueles que, regularmente, em noites ínvias, lincham supostos ladrões do bem-estar.
Unanimidade (5)
Mais um pouco desta série, destinada a propocionar-vos alguns exemplos de unanimidade e conformismo. Olhai à volta, reparai na produção e na reprodução diárias de regras, obediência e punição:
26 junho 2009
Diamantes de sangue no Zimbabwe
Deviz entrevistado por Milton no "Savana"

O presidente do MDM e candidato presidencial Deviz Simango (na imagem) foi entrevistado pelo jornalista Milton Machel para o semanário "Savana" desta semana. Confira aqui.
A "hora do fecho" no "Savana"

Na última página do semanário "Savana" existe sempre uma coluna de saudável ironia que se chama "A hora do fecho". Naturalmente que é necessário conhecer um pouco a alma da vida local para se saber que situações e pessoas são descritas. Deliciem-se com "A hora do fecho" desta semana, da qual ofereço, desde já, um aperitivo:
Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (8)

Do depoimento de E., Moçambicana: "(...) existem muitos estrangeiros, por exemplo temos aqui Burundeses, Somalianos, Zimbabweanos, Sul-africanos, etc., todos negociantes. Eles para além de desenvolverem o negócio normal, também desenvolvem negócio sujo, são traficantes de drogas. Eu não posso apresentar uma prova palpável, mas toda a gente sabe que trazem drogas no nosso país; não são todos, mas alguns. (...) Eles não empregam Moçambicanos e trabalham entre eles, Moçambicanos servem como carregadores de sacos. (...) como é que eles conseguiram dinheiro que investiram no negócio se são refugiados? (...) Burundeses são grandes feiticeiros em negócios e até utilizam gatos nos balcões deles de venda."
Não ter para a tinha
Metralhadoras informais

Morreu Michael Jackson

Morreu ontem, aos 50 anos, vítima de paragem cardíaca, o popular músico, cantor, compositor, actor, publicitário, escritor, produtor, director, dançarino, instrumentista e empresário norte-americano Michael Jackson, cuja música e cuja forma de dançar tanto influenciaram a juventude do nosso país. Confira aqui. Obrigado aos leitores que me advertiram no mural de recados situado no lado direito deste diário.
25 junho 2009
As amêijoas do Costa do Sol



Neste 25 de Junho, dia de festa, fui recordar as amêijoas em molho de alho do Restaurante Costa do Sol, na Avenida Marginal, junto à praia: as amêijoas na foto de cima, o piripiri bem sacaninha a seguir e, em baixo, as amêijoas com o delicioso pão de alho.
Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (7)

(continua)
Por que acreditamos que...? (1)

Estais a ver tanta pergunta desalmada, cada uma aparentemente única, cada uma aparentemente com seu feudo de contexto e significado?
(continua)
24 junho 2009
Aumentar regalias aos deputados

Adenda: recordem a minha série com o título Ministeriáveis e deputáveis.
Negócios e política em Moçambique

Faz tempo - creio que desde Outubro do ano passado, vejam lá que desastrada amnésia a minha - que não vos sugeria a leitura dos cabeçalhos do Africa Intelligence, com o seu aliciante casamento entre negócios e política. Aqui.
Unanimidade (2)

Mais um pouco da série, com um exemplo da clássica experiência de Solomon Asch, boa, em meu entender, para analisar comportamentos de unanimidade e, claro, comportamentos da nossa Assembleia da República, onde o pensamento independente é literalmente apagado pela exigência da unanimidade face ao inimigo político.
(continua)
Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (6)

Prosseguindo esta série, é agora a vez de reproduzir curtos extractos de depoimentos prestados por compatriotas num bairro da periferia de Maputo. Eis J., proprietário de uma barraca: "Nós temos casos aqui no bairro em que os nossos cidadãos trabalham com Burundeses em condições desumanas e são chutados de qualquer maneira e quando reivindicam aparecem outros cidadãos moçambicanos a defender o estrangeiro. (...) Os Burundeses socialmente não são boas pessoas, eles têm um buraco imaginário que a gente não entende e só estamos a assistir que eles evitam ao máximo relacionarem-se com os naturais (...)".
(continua)
Unanimidade (1)

Será sempre fascinante estudar por que e como se produz e reproduz a unanimidade. Pensava naqueles coros unânimes da nossa Assembleia da República, naqueles consensos - de acordo ou desacordo - por bancada. Pensava, quase em simultâneo, nas experiências de Solomon Asch e Stanley Milgram.
(continua)
Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (5)

Mais um pouco da série, com um extracto do depoimento de um comerciante ruandês: "Nós não temos problemas com Moçambicanos. (...) O único problema que temos aqui é com a polícia municipal. Eles não trabalham bem, não nos deixam trabalhar no fim-de-semana. Nos sábados e domingos temos tido muitos problemas com eles e também com jovens. Os jovens nos insultam e dizem que temos de voltar para o nosso país. Eles falam isso principalmente nas sextas e sábados, porque são os dias que bebem muito e consomem drogas. Eles chegam mesmo de bater com pedras na minha loja".
(continua)
23 junho 2009
Estrangeiro escapa ao linchamento em Palma acusado de introduzir a cólera

Adenda: procurei analiar as infra-estruturas sociais e representacionais da crença - de que a cólera é intencionalmente introduzida - no meu livro Cólera e catarse.
Fabricar "nigerianos" com rumores (risco de xenofobia)




Lenda urbana, boato ou rumor é "um relato anónimo, breve, com múltiplas variantes, de conteúdo surpreendente, contado como verdadeiro e recente num meio social do qual exprime de maneira simbólica os medos e as aspirações" (in Renard, Jean-Bruno, Rumeurs et légendes urbaines. Paris: PUF, 2006, 3.e éd., p. 6).
Um anónimo deixou um comentário numa postagem da série com o título O papão "nigeriano" que deixa vermes nas mulheres de Maputo, observando que a imagem do "nigeriano" (aqui reproduzida e a ser distribuída em Maputo; mas podem estar a circular outras imagens) pode ter sido retirada de um livro do médico cirurgião Afonso Paes. Ora, tenho do Doutor Afonso Paes uma obra com a referência Manual de Cirurgia - Cirurgia Geral e Cirurgia Tropical. Ministério da Saúde de Moçambique, 1982, 782 pp., ilustrado. Procurei nela quer a foto reproduzida neste diário quer referências a doenças de rosto, mas nada encontrei. Todavia, o livro contém fotos de doentes que são chocantes para nós leigos (permiti-me mostrar-vos algumas) e que podem ser perfeitamente usadas para criar o pânico e, se me permitirdes a precaução, um movimento de xenofobia. Já agora, sugiro-vos que sigam as minhas séries com os títulos Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo e Notas sobre xenofobia e recordem a série com o título Os riscos do efeito borboleta social na África Austral.
Viana com Deus, Lénine e Samora

Adenda: há tempos, Viana afirmou que o seu partido era guiado por Deus. Com Deus, Lénine e Samora agora, Viana é o destemido cruzado trivalve que faltava à história política do país. Após o desaparecimento dramático de figuras tão garcia marquesianas quanto as de Neves Serrano (e sua criminalística) e Wehia Ripua (e sua cana de pesca), era triste ver o Homo Sibindycus sozinho em sua pimoada caminhada na luta contra a pobreza. Enquanto isso, aguardemos os pronunciamentos do bem-falante Edson Macuácua.
Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (4)
No estabelecimento de G., congolês, muito desconfiado: “(…) Moçambique é um bom país, embora existam pessoas que falam mal de estrangeiros, principalmente jovens bêbedos e drogados. Eles muitas vezes chegam nas nossas mercearias e começam a insultar-nos.”
(continua)
Embaixador da Nigéria intervém a propósito do rumor do papão "nigeriano"

Adenda: bem, creio valer a pena recordar a minha série sobre tão desalmado personagem rumorento com o título O papão "nigeriano" que deixa vermes nas mulheres de Maputo.
Prossegue roubo do desenvolvimento para outros desenvolvimentos

Adenda: a propósito deste tema ao qual tenho dedicado muitas postagens, o AF mandou-me um texto do qual extraí o seguinte: “... Em 2004, quando explodiu a procura voraz da China por aço, começaram a desaparecer tampas de esgoto em todo o mundo. ‘Os primeiros roubos foram sentidos em Taiwan [...], os seguintes ocorreram noutras regiões próximas, como a Mongólia e o Quirguistão [...]. Em Chicago desapareceram mais de 150 tampas no espaço de um mês. Na Escócia, aquando do ‘grande roubo de esgotos’, assistiu-se ao desaparecimento de mais de cem em apenas alguns dias. Em Montreal, Gloucester e Kauala Lumpur, transeuntes incautos caíram dentro de buracos’. Os comerciantes chineses compravam as tampas de esgoto a ladrões locais e, em seguida, cortavam-nas e enviavam-nas para a China; os compradores nem se quer pestanejavam perante as palavras “City of Chicago” gravadas no aço que compravam. Tanto os comerciantes como os compradores precisavam de aço, e alguém o fornecia a preços irresistíveis. No que lhes dizia respeito, esta transacção era apenas um bom negócio” (Napoleoni, 2009: 90). Confira aqui.
22 junho 2009
Diferenças de poder

Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (3)

(continua)
Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (2)

(continua)
Eles e nós: representações sociais num bairro de Maputo (1)

(continua)
Informe de Guebuza e ausência da Renamo

Os deputados do partido Renamo, na oposição, não estiveram presentes.
Como estudante do social, compreendo a posição do partido enquanto momento de luta política.
Como cidadão, condeno-a.
Dos contadores ao espancamento

Comentário: banalmente, pessoas supostas ser ladras ou violadoras sexuais vão sendo espancadas ou linchadas, num exercício sistemático de justiça privatizada como este diário tem abundantemente mostrado.
21 junho 2009
Informe e cidadãos

O papão "nigeriano" que deixa vermes nas mulheres em Maputo (16)

Talvez agora tenha mesmo chegado a altura de terminar esta série, após ter decidido prossegui-la um pouco mais (veja o penúltimo número logo abaixo).
Durante vários dias, procurei sugerir-vos que o rumor do bicho-papão-nigeriano - que creio estar agora atenuado - era um envelope para exprimir vários problemas sociais, era um fusível social, era uma linguagem errada que traduzia, porém, um agregado de problemas verdadeiros, de problemas sentidos pelas pessoas.
A esse envelope foi dada uma cara que parece real, uma cara que até sugere estar doente. A esse propósito, um leitor escreveu o seguinte em comentário: "Vi as fotos da doença que o dito Nigeriano, outras vezes Somali, transmite. Condilomas, verrugas ou coisa similar. Simplesmente estão num estado bastante desenvolvido. Não precisa ser Nigeriano ou Somali para tê-las e transmiti-las."
O rumor em causa não proliferou em meio rural, parece ser iminentemente urbano, gerando uma rápida difusão pelos mais variados meios de comunicação numa cidade - a de Maputo - inquieta, em especial femininamente inquieta, fazendo coabitar em tensão um passado que sempre se supõe mais seguro e um futuro de contornos inquietantes, uma tradicionalidade que se re-anseia e uma modernidade definitivamente instalada com seus riscos, com os seus medos e com as suas aspirações.
Adenda: tenho a suspeita de que este trabalho estraga os desejos de alguns de verem o rumor transformado em realidade. Afinal o que parece...devia ser, não é? Eis o comentário de um anónimo (ou de uma anónima) hoje deixado num dos números da série: "meu deus me espanta como vocês comentadores tem a audácia de dizer que este caso é mentira pois então me explique o caso da miúda que foi vítima será que já viram o estado do seu órgão genital? é que se tivessem visto nada disso falariam. seria inacreditavel na América, Europa, Ásia, mas tamos em África e com a quantidade de curandeiros que temos aqui, sinceramente outros falam como se fossem doutro continente e n conhecessem as maravilhas e n maravilhas do seu. vocês me metem nojo."
(fim)
O papão "nigeriano" que deixa vermes nas mulheres em Maputo (15)

Estive a reler a série com o título em epígrafe e achei que faltava algo, que era necessário considerar mais um fenómeno, a saber:
O rumor do bicho-papão-nigeriano que espalha vermes comedores de fígado pelos órgãos sexuais das mulheres vítimas, aparece embutido numa viatura de luxo, negra, certamente com os vidros fumados, numa imagem que lembra muito, como já referi, o quadro presente no imaginário social no tocante ao tatá papá tatá mamã.
Esse fabuloso carro cujas características exactas ninguém conhece - mas que muitos de nós afirmarão conhecer -, é, afinal, em mais uma hipótese, uma alegoria para expressar o estatuto sinuoso, ambíguo, dos poderosos, para exprimir todos aqueles que constróem a sua riqueza com a desgraça dos pobres. A sua natureza de estrangeiro é exemplar pelo facto de remeter simbolicamente para o exterior a corrosão do tecido social interno. O rumor do bicho-papão-nigeriano é um indicador de desigualdades sociais. Os vermes que é suposto ele espalhar são os arautos da desgraça social.
E prontos, aqui fica o acréscimo, no próximo número, recoloco o trabalho com o qual tinha finalizado a série. Mas com um acréscimo, aguardem.
(continua)
O que é democracia? (5)

Vamos lá a um pouco mais desta série, sempre com um cartoon perverso.
A nossa história, a história do nosso país - a história, afinal, de todos os países -, está cheia de fases intolerantes.
Nessas fases, sucessivas gerações têm sido educadas em formas autoritárias de pensar a sociedade e a ordem, em formas voltadas para a arbitrariedade e para o segredo, em formas de respeito absoluto pelo poder, pela tradição e pelo sagrado, em formas de medo, ordem e comando permanentes, em formas de punição a cargo de vivos e mortos em caso de desobediência, em formas, enfim, de violências múltiplas, físicas e simbólicas. Essas formas têem-se instalado em nós como aguilhões, que agem sem necessidade dos seus agentes (o impulso é a ordem dada; o aguilhão é o efeito da ordem guardado no inconsciente do dominado)
Mas não poucas vezes fazemos um grande esforço para mostrar que, afinal, temos democracia, uma vez que temos eleições multipartidárias. Por outras palavras: democracia é suposta equivaler (e, para muitos, a resumir-se) a eleições.
(continua)